Cláusula ouro e cláusula dólar em contratos no Brasil
O art. 318 do Código Civil (CC/02) determina a nulidade de acordos para pagamento em ouro ou moeda estrangeira. Da mesma forma se utilizadas como referencial para conversão em Real. Em Direito, adjetivar algo de “nulo” significa impedir sua exigibilidade. Ou, em termos simples, vedar a possibilidade de um juiz determinar o cumprimento da obrigação.
Isso impede o negócio? Na prática, não. Mas o cumprimento do acordo dependerá somente da boa-vontade dos envolvidos. Pode-se comparar isso à agiotagem. É proibida. Entretanto, se as partes agirem conforme prometeram, não haverá necessidade de juízes. Saliente-se: trata-se de analogia para facilitar o entendimento. Agiotagem é crime no Brasil, salvo se praticada por integrantes do Sistema Financeiro Nacional. Nesse caso, recebe outro nome. E é considerada legal. (Para os curiosos: art. 4º, Lei 1.521/51; art. 7º, Lei 7.492/86; art. 4º, Decreto 22.626/33; art. 5º, MP 2.170/01, entre outros.)
A vida cotidiana, entretanto, torna os juízes necessários. Celebrar acordos não exigíveis judicialmente é péssima ideia. Porque a boa vontade da parte devedora pode não bastar.
Dito isso, sublinhe-se a possibilidade de alguns poucos negócios atrelados a ouro ou a moeda estrangeira. Mas somente se permitidos expressamente pela lei.
Esclarecida a questão principal, alguns conhecimentos gerais sobre o tema…
MOEDA
Não existe conceito unânime sobre o substantivo. Boa parte dos economistas descreve-o como tudo que possui, em alguma medida, três propriedades: meio de pagamento, unidade de conta e reserva de valor.
Muitas coisas foram usadas como moeda ao longo da História. E várias ao mesmo tempo. Embora alguns metais preciosos como ouro e prata tenham preferência. Foram usados por séculos para a cunhagem de moedas metálicas. Mas havia um problema: o troco! Como valiam muito, foi necessário desenvolver fracionamentos. Às vezes através de moedas em outros metais, como níquel ou bronze, equivalentes a partes de moedas de ouro. Essas moedas não tinham valor em si. Dependiam da promessa de conversibilidade em moedas de ouro.
O “padrão ouro” parece ter tido seu ápice a partir do Século XIX. Mas não se tratava mais do uso coloquial de moedas metálicas de ouro no cotidiano. Era também uma garantia dos Estados para notas em papel e outros artifícios. Na prática, o Estado garantiria a equivalência entre o papel e a quantidade de ouro estocada. E, mais importante, a troca. Veja-se, por exemplo:
Gold Standard Act, 1900: “An Act To define and fix the standard of value, to maintain the parity of all forms of money issued or coined by the United States, to refund the public debt, and for other purposes.”
United States notes became redeemable for gold at the historical rate of $20.67 per ounce. While the statute continued to allow for the use of silver coinage and urged an international agreement on bimetallism, this Act secured the primacy of gold in United States’ monetary policy.
No Brasil, o Decreto 5.108/1926 determinava:
Art. 1º Fica adotado para o Brasil, como padrão monetário, o ouro, pesado em gramas, cuhado em moedas, ao titulo de 900 milésimos de metal fino e 100 milésimos de liga adequada.
§ 1º A moeda será denominada cruzeiro e será dividida em centésimos.
§ 1º Para a moeda divisionária ficam adotadas a prata, níquel e cobre, na proporção respectiva.
Art. 2º Todo o papel-moeda, atualmente em circulação, na importância de 2.569.304:350$500, será convertido em ouro, na base de 0,200 (duzentos miligramas) por mil réis.
Quando esse sistema entrou em colapso, alternativas foram necessárias. Houve discussões sobre o real significado da moeda. No fim, prevaleceu a ideia de que “a moeda é uma criatura da lei” (Georg Friedrich Knapp, em livro de 1905).
A afirmação de Knapp pode ser comprada a outra, usada no meio jurídico: o Direito cria suas próprias realidades. Trata-se de expressão de posição sobre um longo debate sobre origem, fundamentos e aplicação do Direito.
A ideia de Knapp poderia até soar nova. Mas era baseada em fatos há muito perceptíveis. No Brasil, por exemplo, o curso forçado e o poder liberatório da moeda foram estabelecidos muito antes.
Por exemplo, nas Ordenações Filipinas (Livro IV — preservada a construção em português arcaico, mas corrigidas as grafias):
TITULO XXII
Que não enjeite moeda do Rei
Qualquer pessoa, que enjeitar nossa moeda verdadeira lavrada de nosso cunho, e for peão, seja preso e açoitado publicamente, e sendo homem, que não caibam açoites, seja preso e degradado para a África por dois anos (2); e esta mesma pena, haverá o que enjeitar moeda de ouro, que a estes nossos Reinos vier de fora deles. Porém, se as ditas moedas de ouro, assim de nossos Reinos, como de fora deles, e bem assim a nossa moeda dos tostões forem de menos peso do que devem ser, segundo sua Lei e peso, poder-se-ão enjeitar sem pena alguma, salvo se a parte, que a der, quiser refazer a justa valia do que menos pesa, porque em tal caso a não poderão enjeitar, e enjeitando-a, incorrerão nas penas sobreditas.
Perceba-se, o Direito Penal desempenhou importante papel histórico na aceitação dos meios de troca. Açoite e degredo para África garantiam a moeda.
CLAUSULA OURO NO BRASIL
O marco apontado hoje como importante para avaliar a cláusula ouro e assemelhadas no Brasil é o Código Civil de 1916 (CC/16). O artigo 947 permitia a estipulação de pagamento em moeda nacional ou estrangeira. E o devedor poderia optar entre pagar na espécie acertada ou na moeda do lugar do cumprimento da obrigação, pela cotação do dia.
Dizia:
Código Civil de 1916 (CC/16)
Art. 947. O pagamento em dinheiro, sem determinação da espécie, far-se-á em moeda corrente no lugar do cumprimento da obrigação.
§ 1º É, porém, lícito às partes estipular que se efetue em certa e determinada espécie de moeda, nacional, ou estrangeira.
§ 2º O devedor, no caso do parágrafo antecedente, pode, entretanto, optar entre o pagamento na espécie designada no título e o seu equivalente em moeda corrente no lugar da prestação, ao câmbio do dia do vencimento. Não havendo cotação nesse dia, prevalecerá a imediatamente anterior.
§ 3º Quando o devedor incorrer em mora e o ágio tiver variado entre a data do vencimento e a do pagamento, o credor pode optar por um deles, não se havendo estipulado câmbio fixo.
§ 4º Se a cotação variou no mesmo dia, tomar-se-á por base a média do mercado nessa data.
O dispositivo teve sua eficácia suspensa em 1933, num contexto de crise mundial:
Decreto 23.501/1933
[…]
Considerando que o § 1º do art. 947 do Código Civil, como disposição geral destinada à perpetuidade, não colide com a existência, por sua natureza transitória, do curso forçado, mas enquanto este perdura não pode aquele ser aplicado;
[…]
Art. 1º É nula qualquer estipulação de pagamento em ouro, ou em determinada espécie de moeda, ou por qualquer meio tendente a recusar ou restringir, nos seus efeitos, o curso forçado do mil réis papel.
Interessante que num dos diversos “considerandos” do decreto há menção à transitoriedade da suspensão do dispositivo do CC/16. A natureza jurídica no caso específico gera controvérsia. Porque se estava num estado de exceção, com o presidente detendo poderes quase plenos, razoável entender gerassem norma jurídica. Vivia-se numa ditadura. Era o segundo golpe de estado (Decreto 19.398/1930); a República fora o primeiro (Decreto 1/1889).
O Decreto 23.501/33 foi seguido por outras disposições. Vale a pena vê-las por ordem cronológica :
Decreto-lei 236/1938
Art. 1º Em caso de execução ou de falência promovidas no estrangeiro contra bancos ou firmas brasileiras, com fundamento em cláusula ouro de quaisquer contratos e títulos, será negado cumprimento, in limine, às respectivas cartas rogatórias, sendo irrecorrível o despacho denegatório.
Art. 2º Aqueles contra os quais se movam, no estrangeiro ou no Brasil, esses processos, poderão liberar-se mediante depósito, no Banco do Brasil, do correspondente, em moeda nacional, ao débito de moeda estrangeira corrente e não do ouro, constante dos contratos ou títulos, ao câmbio do dia do depósito, sendo este notificado pelo Banco ao respectivo credor, cujo endereço será declarado pelo depositante no ato do depósito.
Parágrafo único. O depósito obriga apenas o Banco à entrega da soma depositada em moeda nacional, podendo, entretanto, si assim preferir o credor, convertê-la em saques da moeda estrangeira, de que resultou o depósito, à taxa do dia de cada remessa e dentro das possibilidades cambiais do país. O direito de utilizar o depósito, por uma dessas duas formas, prescreverá em vinte e quatro meses, contado de sua data.
Decreto-lei 1.079/1939
Art. 1º Os contratos de empréstimo de dinheiro, celebrados no território nacional, até 1 de dezembro de 1933, com garantia de hipoteca de bens imoveis situados no Brasil, embora o valor da quantia mutuada haja sido expresso em ouro ou em moeda estrangeira, reputam-se convencionados em moeda papel nacional, desde que nesta moeda tenha sido fornecida a importância ao mutuário.
Parágrafo único. Neste caso, o mutuário só é obrigado a reatituir ao mutuante, nos termos e condições do contrato, a quantia em moeda papel nacional que houver recebido, ao ser realizado o pacto.
Decreto-lei 6.650/1944
Art. 1º Não se incluem nos dispositivos do Decreto 23.501, de 27 de novembro de 1933, as obrigações contraídas no exterior em moeda estrangeira para serem executadas no Brasil.
Decreto-lei 316/1967
Art. 1º A derrogação do Decreto 23.501, de 27 de novembro de 1933, a que se refere o art. 6º, do Decreto-lei 238, de 28 de fevereiro de 1967, aplica-se sòmente:
I – Aos empréstimos e quaisquer obrigações cujo credor ou devedor seja pessoa residente ou domiciliada no exterior; e
II – Aos negócios jurídicos que tenham por objetivo a cessão, transferência, delegação, assunção ou modificação das obrigações referidas no no I anterior, ainda que ambas as partes contratantes sejam pessoas residentes ou domiciliadas no país.
Decreto-lei 857/1969
Art. 1º São nulos de pleno direito os contratos, títulos e quaisquer documentos, bem como as obrigações que exequíveis no Brasil, estipulem pagamento em ouro, em moeda estrangeira, ou, por alguma forma, restrinjam ou recusem, nos seus efeitos, o curso legal do cruzeiro.
Art 2º Não se aplicam as disposições do artigo anterior:
I – aos contratos e títulos referentes a importação ou exportação de mercadorias;
II – aos contratos de financiamento ou de prestação de garantias relativos às operações de exportação de bens e serviços vendidos a crédito para o exterior;
III – aos contratos de compra e venda de câmbio em geral;
IV – aos empréstimos e quaisquer outras obrigações cujo credor ou devedor seja pessoa residente e domiciliada no exterior, excetuados os contratos de locação de imóveis situados no território nacional;
V – aos contratos que tenham por objeto a cessão, transferência, delegação, assunção ou modificação das obrigações referidas no item anterior, ainda que ambas as partes contratantes sejam pessoas residentes ou domiciliadas no país.
Parágrafo único. Os contratos de locação de bens móveis que estipulem pagamento em moeda estrangeira ficam sujeitos, para sua validade a registro prévio no Banco Central do Brasil.
Lei 10.406/02 (Código Civil de 2002)
Art. 2.045. Revogam-se a Lei n º 3.071, de 1º de janeiro de 1916 – Código Civil e a Parte Primeira do Código Comercial, Lei nº 556, de 25 de junho de 1850.
Lei 14.286/21
Art. 28. Ficam revogados: […]
XIV – o Decreto-Lei nº 857, de 11 de setembro de 1969;
Vê-se que a transitoriedade prevista originalmente em 1933 nunca aconteceu. A vedação perdurou desde aquela época como regra geral. Será?
A ROUPA NOVA DO REI
Um dos objetivos da cláusula ouro é a manutenção do poder de compra. Apesar de ter preços flutuantes, o ouro apresenta razoável garantia de valor. As pessoas usam-no como meio de guardar “capacidade de troca” para tempos futuros.
A partir dos Anos 1940, a inflação disparou no Brasil. Tanto que foi necessário desenvolver um meio legal para representar a perda do poder de compra da moeda em balanços de pessoas jurídicas. Exemplo disso foi o art. 57 da Lei 3.470/58. Previa: “… as firmas ou sociedades poderão corrigir o registro contábil do valor original dos bens do seu ativo imobilizado até o limite das variações resultantes da aplicação, nos termos deste artigo, de coeficientes determinados pelo Conselho Nacional de Economia, cada dois anos”.
Aponta-se o texto acima como um dos embriões da “correção monetária”. Ela nada mais é do que uma expressão de indexação, de tentativa de garantir a manutenção do poder de compra. Em outros termos, objetivo semelhante à obrigação de pagamento com relações em ouro ou moeda estrangeira.
Contudo, o resultado dos índices utilizados para medir a inflação (a perda do poder de troca) difere. Cada índice é composto pela variação ponderada de dezenas ou mais de preços. Logo, os resultados podem não refletir aquilo que as pessoas imaginam estar ali representado.
Além disso, somente os índices oficiais de correção monetária podem ser utilizados no Judiciário. Quem contra os índices, controla a variação atribuível ao poder de compra.
NOS TRIBUNAIS
Para encerrar, uma busca por “cláusula ouro” no site do Supremo Tribunal Federal apontou apenas cinco processos.
Veja-se suas ementas:
Empréstimo feito em libras esterlinas com a garantia hipotecária de imóveis situados no Brasil. Decretos n° 23.501 de 1933 e 1079 de 1939. Abolição da cláusula ouro nos contratos exequíveis no território nacional. Retroatividade. Ação declaratória. O pagamento deve ser efetuado em moeda legal brasileira e segundo o câmbio da data do contrato. Jurisprudência da Suprema Corte. Conhece-se do recurso, mas nega-se-lhe provimento.
(RE 7921, Relator(a): BARROS BARRETO, julgado em 15/06/1944)
CLÁUSULA-OURO. DEC. 23.501, DE 27 DE NOVEMBRO DE 1953. INTERPRETAÇÃO DE CONTRATO. INOCORRENCIA DE VULNERAÇÃO DO IUS IN THESI. DESCABIMENTO DO RECURSO.
(RE 19605, Relator(a): OROZIMBO NONATO, Segunda Turma, julgado em 05/04/1955)
Clausula – ouro; sua inadmissibilidade. Principio nominalista: o pagamento deve ser feito pela moeda corrente atual, pouco importando que a desaparecida moeda do contrato apresentasse específico valor ou obedecesse ao padrão-ouro. Dec. nº 23.501, de 1933. Capitalização de juros; inadmissibilidade e temperamento.
(RE 29032, Relator(a): NELSON HUNGRIA, Primeira Turma, julgado em 09/04/1956)
CLÁUSULA OURO – A LEI FEDERAL N. 28, DE 15 DE FEVEREIRO DE 1935, SUPEROU A LEGISLAÇÃO PROIBITIVA E, ASSIM, E ADMISSIVEL A CLÁUSULA OURO NOS CONTRATOS PARA IMPORTAÇÃO DE MERCADORIAS DO ESTRANGEIRO, INCLUSIVE NOS CELEBRADOS PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – INTERPRETAÇÃO DE CLAUSULAS CONTRATUAIS – NÃO CONHECIMENTO DOS EXTRAORDINÁRIOS.
(RE 43194, Relator(a): BARROS BARRETO, Primeira Turma, julgado em 19/11/1959)
CLÁUSULA OURO. CONTRATO FEITO EM MOEDA ESTRANGEIRA. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA QUE ADMITE O PAGAMENTO EM MOEDA ESTRANGEIRA, ENTRE OUTROS, A CREDORES ESTRANGEIROS. PARTICULARIDADE DO CASO QUE TRATA DE CREDOR COM SEDE DE ESTABELECIMENTO EM PAÍS ESTRANGEIRO ONDE FUNCIONA, PARTICULARIDADE DO CASO. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO.
(RE 66116, Relator(a): THEMISTOCLES CAVALCANTI, Tribunal Pleno, julgado em 11/12/1968)
No Superior Tribunal de Justiça (STJ), busca relacionada ao art. 318, CC/02 (art. 947, CC/16), resulta em algumas ementas curiosas. Ressalte-se que abaixo estão transcritas apenas partes das ementas. Deve-se ler a íntegra do acórdão para ter segurança no seu uso como precedente.
a) Contratos em moeda estrangeira: “são legítimos os contratos celebrados em moeda estrangeira, desde que o pagamento se efetive pela conversão em moeda nacional. Legalidade do reembolso se a moeda estrangeira for convertida em reais usando a cotação do dia do desembolso, seguida de atualização monetária. Afastamento do ressarcimento de valores em dólar americano ou em euro ou a indexação de dívida pela variação cambial.” (RESP 1.632.752, julgado em 22/8/2017)
b) Contratos relacionadas a fundos específicos: “Ação revisional. Contrato de financiamento com recursos do Fundo da Marinha Mercante – FMM. Reajuste do saldo devedor atrelado à variação cambial do dólar americano. Legitimidade das cláusulas contratuais.” (AgRg no ARESP 655.266, julgado em 7/4/2015)
c) Global Notes: “ação de cobrança. Global notes. […] O STJ pacificou o entendimento de que, “as dívidas fixadas em moeda estrangeira deverão, no ato de quitação, ser convertidas para a moeda nacional, com base na cotação da data da contratação, e, a partir daí, atualizadas com base em índice oficial de correção monetária” (RESP 1.323.219)” (AgRg no RESP 1.342.000, julgado em 4/2/2014)
d) Empréstimos em moeda estrangeira: “O art. 1º da Lei 10.192/01 proíbe a estipulação de pagamentos em moeda estrangeira para obrigações exequíveis no Brasil, regra essa encampada pelo art. 318 do CC/02 e excepcionada nas hipóteses previstas no art. 2º do DL 857/69. A despeito disso, pacificou-se no STJ o entendimento de que são legítimos os contratos celebrados em moeda estrangeira, desde que o pagamento se efetive pela conversão em moeda nacional. […] Quando não enquadradas nas exceções legais, as dívidas fixadas em moeda estrangeira deverão, no ato de quitação, ser convertidas para a moeda nacional, com base na cotação da data da contratação, e, a partir daí, atualizadas com base em índice oficial de correção monetária.” (RESP 1.323.219, julgado em 27/08/2013)
e) Arrendamento mercantil: “Em contrato de arrendamento mercantil é válida cláusula de reajuste das prestações com base na variação da cotação de moeda estrangeira (Lei 8.880/94, art. 6º), devendo os prejuízos advindos da vultosa sobrevalorização do dólar norte-americano ocorrida em janeiro de 1999 ser suportados em partes iguais pelos contratantes.” (EDcl no AgRg no RESP 417.878, julgado em 27/11/2012)
f) Sentença estrangeira: “O fato de a sentença estrangeira conter condenação em dólares norte-americanos não fere o art. 318 do Código Civil ou o Decreto-Lei n. 857, de 11.9.1969, e não impede a homologação, mesmo porque não se poderia exigir que a sentença proferida no exterior, decorrente de obrigação financeira lá assumida, imponha condenação na moeda brasileira. Ao interessado caberá, no momento próprio, durante a execução da sentença estrangeira no Brasil, postular o que for de direito a respeito da conversão do dólar norte-americano em reais.” (SEC 6.069, julgado em 24/11/2011)
g) Curso forçado: “A peculiaridade do processo reside em acordo firmado entre as partes em sede de separação judicial, no qual a moeda americana serviu apenas como paradigma para estipulação dos valores a serem pagos pela conversão em moeda nacional. […] Desde que expressamente previsto que o pagamento realizar-se-á por meio da respectiva conversão em moeda nacional, é válida a contratação em moeda estrangeira, consideradas as peculiaridades do processo. A obediência ao curso forçado da moeda nacional implica na proibição do credor de se recusar a receber o pagamento da dívida em reais e faz surgir a conclusão de que o momento da conversão em moeda nacional é o do pagamento da dívida e não o do ajuizamento da execução.” (RESP 647.672, julgado em 14/2/2007)
Avançando aos tribunais estaduais, duas decisões mais recentes mencionando “clausula ouro” são do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (de 2000, citando julgado de 1983) e do extinto Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul (de 1996). Como curiosidade, veja-se:
“- EMBARGOS DO DEVEDOR – APELAÇÃO CÍVEL 87195 – Reg. 2383 – PRIMEIRA CÂMARA – Unânime – Juiz: RUI OCTAVIO DOMINGUES – Julg: 31/05/83 – COMISSÃO DE PERMANÊNCIA, MULTA CONTRATUAL E JUROS – SFN. A lei de Usura, Decreto n. 22626, de 1933, que fazia parte do sistema legal do Governo Provisório do regime da Revolução de 1930, completa-se pela lei que proibia a cláusula ouro (e todas as formas de indexação). Com o regime de 1964 instituiu-se, ao contrário, o regime da cláusula ouro (todas as formas de indexação são permitidas) e dos juros ilimitados, tendo em vista uma nova filosofia econômica, dirigida por outros objetivos e interesses. Só há limitação de cobrança de juros para os particulares, não para os Bancos e Financeiras, tendo em vista altos interesses do Estado brasileiro. O Decreto n. 22626, de 1933, Lei da Usura, não está revogado, mas suas disposições não alcançam os juros, comissões de permanência, correção monetária e outros adminículos do sistema bancário. Dispõe a Súmula do Egrégio Supremo Tribunal Federal, no tópico n. 596: ‘As disposições do Decreto n. 22626/33 não se aplicam às taxas de juros e outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional’. Outrossim, é certo que apresenta-se tranquilo o entendimento de que o artigo 192, parágrafo 3º, da Constituição Federal é de eficácia limitada porque depende de regulamentação por parte do legislador infra constitucional.”
(TJSP; Apelação Com Revisão 0045976-07.1998.8.26.0000; Relator (a): Roque Antonio Mesquita de Oliveira; Data do Julgamento: 24/10/2000)
É insuficiente o deposito quando o preço é consignado apenas no valor nominal e, embora nula a previsão de reajuste pela clausula ouro, o consignante não realiza qualquer espécie de complemento por outro indexador. Sendo a correção monetária mera atualização da moeda, o deposito liberatório há de se realizar com a correção por indexador outro. Embargos rejeitados.
(Embargos Infringentes, Nº 195080189, Quarto Grupo de Câmaras Cíveis, Tribunal de Alçada do RS, Relator: Cláudio Caldeira Antunes, Julgado em: 21-10-1996)
Por fim, relembre-se que são nulas as convenções de pagamento em ouro ou em moeda estrangeira. Da mesma forma, os acordos para compensar a diferença entre o valor da moeda estrangeira (e do ouro) e o da moeda nacional. Salvo nos casos previstos na legislação especial.